Contexto
Nos últimos anos, as plataformas digitais se tornaram ambientes cada vez mais hostis para grupos vulnerabilizados, especialmente a população LGBTQIA+. Campanhas de ódio, difamação e incitação à violência têm sido sistematicamente direcionadas a pessoas LGBTQIA+, com um impacto desproporcional sobre pessoas trans e não binárias. Essas práticas não apenas geram graves danos psicológicos e físicos, mas também contribuem para a exclusão dessa população do espaço público e virtual.
Em maio de 2024 e nos meses que seguiram, o podcast Entre Amigues, produzido pela Código Não Binário, foi alvo de uma onda massiva de ataques após abordar questões de identidade de gênero e diversidade. A situação escalou quando figuras da extrema-direita, como o deputado Nikolas Ferreira, incitaram o ódio contra as apresentadoras e convidades do programa, expondo as falhas das plataformas em moderar conteúdos prejudiciais e proteger seus usuários. Esses eventos trouxeram à tona a vulnerabilidade das pessoas LGBTQIA+ nas redes sociais, bem como a conivência das big techs com discursos de ódio.
A violência online, exacerbada por algoritmos que amplificam mensagens de ódio, afeta desproporcionalmente pessoas trans, outras identidades LGBTQIA+ e também pessoas comunicadoras que atuam na defesa dos direitos humanos. Estudo da ILGA de 2024 mostra que quase 90% das pessoas LGBTQIA+ relataram ter enfrentado abuso online, com impactos diretos na saúde mental, participação política e bem-estar geral.
Violações de Direitos e a Ameaça da Agenda de Extrema-Direita
Recentemente, a Meta anunciou a redução de seus mecanismos de moderação de conteúdo. Além disso, a empresa autorizou expressamente em suas políticas a associação de dissidências de gênero e sexualidade a doenças mentais, legitimando discursos discriminatórios.
Essas mudanças refletem uma preocupação maior: a virada das grandes empresas de tecnologia em direção a uma agenda de extrema-direita. Ao monetizarem discursos de ódio e permitirem a disseminação de conteúdos que violam os direitos humanos, essas plataformas contribuem para um ambiente de crescente intolerância e violência. Nesse contexto, pessoas LGBTQIA+, especialmente trans, e também pessoas comunicadoras — particularmente aquelas comprometidas com a defesa dos direitos humanos — tornam-se alvos preferenciais de campanhas de difamação, silenciamento e perseguição.
A ausência de moderação potencializa a desinformação, limita o debate democrático e perpetua visões prejudiciais sobre grupos como a população LGBTQIA+, além de atacar grupos de pessoas comunicadoras que exercem papel fundamental na defesa da verdade, dos direitos e da democracia. Táticas incluem associar pessoas trans a práticas criminosas ou imorais e desacreditar quem produz informação de interesse público, reciclado narrativas usadas historicamente contra movimentos feministas e de direitos humanos. Esse ambiente de desinformação visa não apenas silenciar indivíduos, mas também desmantelar avanços institucionais, legislativos e ameaçar a liberdade de expressão.
Litigância Estratégica
As grandes plataformas digitais têm contribuído para a disseminação de discursos de ódio, afetando gravemente tanto a população LGBTQIA+ quanto pessoas comunicadoras que se dedicam à defesa dos direitos humanos. A litigância estratégica se apresenta como uma ferramenta essencial para mobilizar o Estado e a sociedade civil na defesa dos direitos fundamentais e na busca por responsabilização dessas empresas.
A Código Não Binário, em colaboração com outras organizações da sociedade civil, está estruturando uma Ação Civil Pública (ACP) que visa enfrentar a inação das plataformas digitais e exigir a proteção efetiva tanto da população LGBTQIA+ quanto de grupos de pessoas comunicadoras expostas ao ódio online. A ação será fundamentada em princípios constitucionais, garantindo que essas empresas, ainda que transnacionais, sejam obrigadas a respeitar a legislação brasileira e os direitos fundamentais de igualdade, dignidade, não discriminação e liberdade de expressão.
Nosso objetivo é garantir que as plataformas adotem políticas mais transparentes e eficazes de moderação de conteúdo, bem como que sejam responsabilizadas pelos danos causados por suas práticas. A abordagem proposta abarca a necessidade de maior transparência, supervisão pública e reparação dos danos causados às comunidades afetadas, trazendo inclusive retornos para as organizações participantes.
Sabemos que as ondas de ódio online não se limitam a uma única plataforma; elas se retroalimentam, criando um ambiente digital cada vez mais hostil. Assim, buscamos uma abordagem inovadora e coletiva, reunindo esforços de diferentes setores para fortalecer nossa ação e garantir uma resposta abrangente e eficaz.
Nosso compromisso é atuar de forma articulada com organizações parceiras — tanto de defesa dos direitos digitais e LGBTQIA+, quanto de liberdade de expressão e comunicação — para construir uma ação robusta e efetiva, capaz de gerar precedentes importantes na defesa dos direitos humanos no ambiente digital.
Convite para Organizações
Convidamos associações civis a se unirem a essa iniciativa como coautoras da Ação Civil Pública. Ao compor essa coalizão, buscamos amplificar nossas vozes, fortalecer a legitimidade da ACP e mobilizar a sociedade para exigir responsabilização das Big Techs.
Temos avançado muito nessa construção e contamos com uma base sólida para seguir adiante:
- Já reunimos toda a documentação necessária para embasar a ação, com provas concretas e registros que mostram de forma clara os danos causados pelo discurso de ódio nas plataformas digitais.
- Nossa tese jurídica está bem definida, e a ação não se limitará a uma única empresa, pois sabemos que o problema é amplo e envolve todas as plataformas, que criam um ecossistema digital onde os ataques se retroalimentam e se espalham de maneira coordenada.
- Nossa proposta inclui uma reivindicação de indenização pelos danos já sofridos, garantindo que os recursos possam ser revertidos para iniciativas de proteção e fortalecimento da comunidade LGBTQIA+, das organizações litisconsortes e também de pessoas comunicadoras comprometidas com os direitos humanos.
- Contamos com parcerias estratégicas que fortalecem nossa atuação, trazendo expertise técnica e experiência em direitos digitais, LGBTQIA+ e comunicação.
Acreditamos que esse é o momento certo para agir. Essa é uma oportunidade de atuar de forma concreta contra o ódio online e contribuir para a construção de um ambiente digital mais seguro, livre e inclusivo para todas as pessoas e para quem exerce comunicação comprometida com os direitos humanos.
Fase Atual do Projeto
A Ação já está sendo estruturada com o suporte de uma equipe jurídica experiente e um escritório de advocacia já comprometido em liderar o processo. Para se juntar à Ação Civil Pública, não é necessário que sua organização tenha representação jurídica própria, mas, caso tenha, suas advogadas e advogados podem se somar à equipe já existente, contribuindo para a construção coletiva dos argumentos.
As organizações interessadas irão participar como coautoras da ação, fortalecendo o grupo de pleiteantes. Além disso, caso tenham mapeado evidências, relatos ou documentação que demonstrem as falhas das plataformas digitais — seja no contexto de ataques a pessoas LGBTQIA+ ou a pessoas comunicadoras — sua contribuição será inestimável para reforçar os fundamentos da ação.
Acreditamos que esta ação tem o potencial de mobilizar a opinião pública e avançar o debate sobre a responsabilidade das big techs na proteção de direitos humanos no espaço digital. Além disso, uma eventual vitória poderá resultar em reparações financeiras significativas, que serão revertidas para fortalecer as organizações coautoras e seus esforços em prol da população LGBTQIA+ e da comunicação livre e comprometida com os direitos humanos.
Contato
Para maiores informações e para se juntar a este esforço, entre em contato conosco pela sua opção preferida:
- Por e-mail com Amanda Claro (Advogada e Diretora de Projetos da Código Não Binário)
- Por WhatsApp com o Atendimento da Código Não Binário
- Diretamente no grupo de discussão “ACP Mobilização”